O músico brasileiro Avraham de Carvalho, de 29 anos, é reconhecido nas ruas de Israel. Um dos finalistas da temporada de 2019 do concurso de talentos “A Próxima Estrela”, ele ficou famoso como o cantor brasileiro que entoava com primor, e em inglês perfeito, grandes baladas e sucessos da música pop.
No programa, Carvalho avançou semana a semana, com a aprovação dos jurados e do público enquanto mirava no prêmio final: representar Israel no Festival Eurovisão, assistido ao vivo por mais de 200 milhões de telespectadores. Israel venceu o Eurovisão de 2018 e foi o anfitrião do festival este ano, em Tel Aviv.
O brasileiro quase chegou lá: ficou em quinto lugar, eliminado apenas na semifinal. Mesmo assim, a fama o transformou em celebridade nas ruas.
“As pessoas me reconhecem. E o mais incrível é a faixa etária, que vai de crianças de 7, 8 anos, a pessoa de idade. Isso é incrível”, diz Carvalho. “Uma vez, eu estava num restaurante e chegou uma mãe com um menino de uns 10 anos de idade. Ela falou: meu filho não ia dormir antes de ver você cantar. Isso me alegra muito”.
Natural de Balneário Camboriú, em Santa Catarina, Avraham de Carvalho chegou em Israel há pouco menos de três anos. Ele foi criado em família cristã evangélica, mas, aos 17 anos, descobriu que tanto as famílias de seu pai quanto de sua mãe têm ascendência judaica. Logo após a revelação, iniciou um processo de conversão ao judaísmo e decidiu morar em Israel.
No país, adotou o nome de Avraham, original em hebraico do nome de batismo: Abraão. E, na bagagem, levou o talento musical, que ficou claro desde a infância, quando se apresentava em eventos religiosos.
“A música é uma realidade para mim desde que eu me entendo por gente”, conta. “Desde os 4 anos de idade, quando o meu pai comprou um CD para eu começar a cantar, ele percebeu que eu tinha um dom, um talento. Eu me agarrei nisso, e comecei a cantar desde pequeno. Com 9 anos de idade eu comecei a estudar música, teclado, piano, alguns instrumentos como um saxofone, violino.”
O talento musical acabou ditando seu destino no país que escolheu para viver. Sem nada a perder ou contatos no meio artístico local, se inscreveu no programa que revelou a cantora Netta Barzilai, vencedora do Eurovisão de 2018. Com um hebraico imperfeito, ele se comunicou muitas vezes em inglês durante o programa. Mas não sentiu preconceito algum – pelo contrário.
“Os israelenses são muito amigáveis. Então é muito fácil você fazer amizade, conversar, iniciar uma conversa do nada. O israelense é muito curioso também, então você está lá na sala com os outros participantes e todo mundo já começa a perguntar: ‘o que que você vai cantar’, ‘qual é o teu nome’, ‘de onde você vem’? Percebem que meu sotaque e os israelenses amam o Brasil”, relata o catarinense.
Participar do programa não foi fácil. As pressões para alcançar a perfeição em pouco tempo de filmagem causaram-lhe estresse e nervosismo. Uma dessas pressões foi a da imagem: os produtores decidiram que ele se apresentaria o tempo todo ao piano, o que nem sempre era sua escolha.
Fora isso, por ser fã de cantores como Céline Dion, Whitney Huston, Amy Winehouse e Sam Smith, Carvalho escolheu cantar sempre baladas famosas em inglês, apesar dos pedidos para cantar também em português e espanhol.
“As pessoas têm aquela imagem de você como brasileiro. Eles amam o Brasil, amam a música brasileira. Então, automaticamente perguntam: ‘por que você não canta em português’? De fato, não cantei em português. Não desenvolvo a minha carteira no português, é totalmente em inglês”, explica.
Tudo isso leva Avraham de Carvalho a rejeitar participar de novos reality shows, pelo menos por enquanto. A competição com outros cantores diante de juízes e do público foi desgastante. Ele prefere desenvolver a carreira com um álbum pessoal e músicas próprias, que está em produção.
Meses após o fim do programa, em fevereiro, ele é convidado a cantar em eventos e festas. O brasileiro prepara sua primeira turnê por Israel, que começará em novembro nas principais cidades do país: Tel Aviv, Jerusalém, Haifa e Beer Sheva.
A pressão por manter o nome relevante é algo conhecido entre participantes de concursos televisivos. “Existe, sim, essa pressão de estar produzindo algo. Música é uma coisa que você não pode parar. Hoje, a exposição que eu recebi no programa me proporciona estar vivendo disso, fazendo eventos e abrindo shows, planejando a turnê. Mas é algo contínuo”, afirma Carvalho. “Se você parar por algum instante, já desce. Se manter na mídia não é fácil e é essa a questão. Você tem que procurar estar sempre fazendo algo.”
Enquanto desenvolve a carreira, Avraham de Carvalho se encontra como pessoa. Durante o processo de conversão ao judaísmo, assumiu a homossexualidade e se casou com um israelense, que é, hoje, seu agente. O casamento foi no Brasil e, posteriormente, foi reconhecido em Israel.
Isso o levou a buscar a continuação do processo de conversão através de uma sinagoga reformista, já que, pelos ultraortodoxos, não seria mais possível. “Essa comunidade nos recebe e nos permite manter as nossas tradições, nos juntar a outros casais, famílias, não de homossexuais ou héteros, mas de qualquer modalidade. Fazemos juntos as nossas tefilot, nossas orações.”
// RFI