Em meio a inquérito nos EUA, presidente Zelensky se vê num dilema: se confirmar pressão de Washington, perde a boa vontade de Trump. Se desmentir, arrisca fechar a porta para uma futura Casa Branca sob Joe Biden.
Volodymyr Zelensky queria alcançar fama internacional. Seu sonho se tornou realidade – mas não da forma que ele imaginava. Como ator, ele sonhava ser célebre no mundo inteiro, disse numa entrevista, no início de outubro. Mas “isso, eu não queria”, comentou o presidente da Ucrânia sobre seu papel como figura-chave nos pré-inquéritos para um possível processo de impeachment contra seu homólogo americano, Donald Trump.
Meio ano após ser eleito, o bem-sucedido humorista de TV, de 41 anos, e com ele, toda a Ucrânia, está na mira da política dos Estados Unidos e da mídia, e a tendência é crescente. O detonador foi o relatório anônimo de um whistleblower dos meios de segurança americanos sobre um telefonema entre Trump e Zelensky, em 25 de julho.
Os democratas do Congresso dos EUA acusam seu presidente de abuso do cargo, por ter sugerido investigações contra o ex-vice-presidente Joe Biden, possível adversário de Trump nas eleições de 2020. Antes do telefonema, o presidente sustara centenas de milhões de dólares destinados à ajuda militar para a Ucrânia. Trump e Zelensky negam ter havido pressão de Washington sobre Kiev.
Caso se inicie o processo de impeachment, políticos ucranianos também deverão ser convidados a depor em Washington. Nunca, na história recente, a antiga república soviética recebeu tanta atenção, nem mesmo durante a anexação da Crimeia, em 2014. Mas, se na época o país tinha que se esforçar, por todo o mundo, para obter atenção, desta vez é o contrário.
Zelensky praticamente não se pronuncia em público sobre os desdobramentos na capital americana. A Ucrânia está “cansada” da celeuma em torno da controversa participação do filho de Biden na empresa privada de gás Burisma, declarou o presidente nesta terça-feira (19/11) à emissora americana de TV CNN: o país já tem “suficientes problemas próprios”.
Segundo o colunista da DW em Kiev Serhiy Rudenko, Zelensky se encontra num dilema.
“Se ele admitir que houve pressão de Washington, perde a boa vontade do atual presidente dos EUA. Se desmentir, arrisca assim fechar a porta para a futura Casa Branca, caso Joe Biden assuma.”
Volodymyr Yermolenko, da organização midiática Internews Ukraine, vê a situação de forma semelhante: “Creio que a estratégia de Kiev consiste em evitar tomar partido”, comentou à DW. A Ucrânia não pode se permitir perder o apoio americano, pois assim ficaria, de fato, sozinha diante da Rússia.
No entanto, Kiev não permaneceu inteiramente neutro, e anunciou que o caso Burisma voltou a ser examinado pela Procuradoria-Geral do país. Também a suposta ingerência ucraniana no pleito presidencial americano de 2016 poderá ser investigada, declarou Zelensky, frisando que Washington não apresentou quaisquer provas de tal interferência.