Procurador do MPT: Governo Temer deu golpe mortal no combate à escravidão

Marcos Corrêa / PR / Agência Brasil

A portaria publicada nesta segunda-feira (16) pelo governo do presidente Michel Temer que restringe o combate ao trabalho escravo é um golpe mortal para a luta contra uma das maiores pragas sociais do Brasil, segundo a opinião do titular do órgão pela erradicação dessa prática.

“As novas regras acabam com o combate ao trabalho escravo no Brasil, pois alteram diretamente o coração da legislação, que é o conceito de trabalho escravo”, disse à EFE o responsável pela Coordenadoria Nacional de Erradicação do Trabalho Escravo (Conaete) do Ministério Público do Trabalho (MPT), Tiago Muniz Cavalcanti.

De acordo com Cavalcanti, “limitar a definição de trabalho escravo à restrição de ir e vir de um trabalhador é um equívoco histórico e jurídico“.

O procurador do MPT explicou que esta nova definição não leva em conta outras práticas que podem caracterizar o trabalho análogo à escravidão, como as jornadas exaustivas, os descontos no salário de supostas dívidas por alimentação e alojamento, o trabalho em condições degradantes e as intimidações, inclusive armadas, para que o trabalhador não denuncie sua situação às autoridades.

“Essa portaria é o maior retrocesso que os esforços de combate ao trabalho escravo no Brasil sofreram em muitas décadas e viola a Constituição e as normas que o governo assinou como membro da Organização Internacional do Trabalho (OIT)”, acrescentou o procurador.

A nova portaria, anunciada nesta segunda pelo governo Temer sem nenhum estudo prévio, não limita apenas a ação dos fiscais que combatem a exploração trabalhista, mas também restringe a divulgação das listas de empresas envolvidas com trabalho escravo.

O texto, que recebeu críticas duras e imediatas das organizações de defesa dos direitos humanos, altera o conceito de trabalho escravo ou análogo à escravidão e diz que só poderão ser qualificados assim os casos em que haja uma clara “restrição da liberdade” de movimento dos empregados.

A portaria também estabelece que, de agora em diante, a lista de empresas punidas por trabalho escravo, a chamada “lista suja”, só poderá ser publicada se existir uma “determinação expressa” do ministro do Trabalho.

“É mais um retrocesso condicionar a publicação (da lista) à vontade política do ministro. Não há dúvida que a lista nunca mais será divulgada ou que, caso seja publicada, os nomes de várias empresas serão retirados”, afirmou Cavalcanti.

O procurador do MPT assegurou que a publicação periódica da lista se transformou em uma importante ferramenta de combate ao trabalho escravo, não só pela condenação moral que isso representa, mas também porque os bancos suspendem os créditos para essas companhias.

“É uma portaria totalmente ilegal e inconstitucional porque o trabalho escravo é a maior violação que existe contra a dignidade da pessoa humana, consagrada pela Constituição”, disse o representante do MPT.

Cavalcanti indicou que a primeira medida do Ministério Público para impedir esse retrocesso será recomendar ao Ministério do Trabalho a imediata revogação da nova portaria.

Para o procurador, as novas regras eram uma reivindicação antiga dos latifundiários e dos parlamentares que defendem os interesses dos grandes proprietários de terras.

“Não há dúvida que houve pressão. As normas eram defendidas pelos latifundiários e o governo Temer se aproximou muito deles. A imprensa diz que foi uma troca de favores. Não podemos dizer que, de fato, houve essa troca, mas é uma denúncia que faz sentido”, opinou Cavalcanti.

“A falta de vontade política do atual governo para enfrentar a escravidão contemporânea se evidencia há algum tempo. Primeiro foi a suspensão da publicação da ‘lista suja’, depois a suspensão dos recursos para os grupos de controle e, mais recentemente, a demissão do chefe do grupo de combate ao trabalho escravo”, completou o procurador.

Cavalcanti assegurou que a redução dos recursos ficou evidente na diminuição do número de trabalhadores libertados da escravidão.

Esse número era de uma média de 2 mil por ano em meados da década de 2000 e caiu para 680 em todo ano de 2016 e para 110 neste ano de 2017.

“Neste momento, não há controle e, por isso, há essa queda abrupta. Não significa que temos menos escravos. Significa que deixamos de libertá-los“, finalizou Cavalcanti.

Ciberia // EFE

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