Cientistas da Universidade da Califórnia em São Francisco (EUA) desenvolveram um implante cerebral que pode ler a mente das pessoas e transformar seus pensamentos em fala.
A descoberta pode ajudar pessoas com doenças que impactam sua capacidade de falar, como lesões cerebrais, câncer de garganta, alguns tipos de derrame e doenças neurodegenerativas como Parkinson e esclerose múltipla.
Um artigo sobre a pesquisa foi publicado esta quarta-feira (24) na revista científica Nature. A tecnologia, que os cientistas dizem que é muito entusiasmante, funciona em dois estágios.
Primeiro, um eletrodo é implantado no cérebro para captar os sinais elétricos que manobram os lábios, a língua, a laringe e a mandíbula. Seguidamente, um tipo de computação poderoso é usado para simular como os movimentos da boca e da garganta formam sons diferentes. Isso resulta em uma fala sintetizada saindo de um “trato vocal virtual”.
Os pesquisadores realizaram experimentos com cinco pacientes que estavam no hospital sendo avaliados para cirurgia de epilepsia. Os participantes do estudo foram orientados a não realizar movimentos específicos da boca, apenas ler algumas frases. A ideia era traduzir atos de fala naturais em movimentos em si.
O resultado não é perfeito. Ouvintes foram capazes de discernir o que estava sendo falado em até 70% do tempo, quando receberam uma lista de palavras para escolher.
Você pode ouvir uma gravação da fala sintetizada abaixo. A frase está em inglês: “The proof you are seeking is not available in books”, que significa “A prova que você está procurando não está disponível nos livros”.
Outros estudos tentaram traduzir pensamentos em fala “vasculhando” o cérebro em busca dos padrões de sinais elétricos que codificam para cada palavra. Estas pesquisas tiveram sucesso limitado. Ao se concentrar no formato da boca e nos sons que esses formatos produzem, os cientistas do novo estudo alcançaram um resultado eficaz inédito.
Segundo Edward Chang, um dos pesquisadores, “pela primeira vez, demonstramos que podemos gerar frases orais inteiras baseadas na atividade cerebral de um indivíduo. Esta é uma estimulante prova de princípio de que, com a tecnologia que já está ao nosso alcance, devemos ser capazes de construir um dispositivo que seja clinicamente viável em pacientes com perda de fala”.
Uma ressalva é que a tecnologia depende do funcionamento correto das partes do cérebro que controlam os lábios, a língua, a laringe e a mandíbula. Assim, pacientes com alguns tipos de derrame, por exemplo, não poderiam se beneficiar. “Esta não é uma solução para todos que não podem se comunicar”, explica Chang.
Há também uma perspectiva mais distante de ajudar pessoas que nunca falaram, incluindo algumas crianças com paralisia cerebral. Tais pacientes poderiam aprender a se comunicar oralmente com esse tipo de dispositivo.
Será que essa tecnologia poderia ser usada de forma nefasta para ler pensamentos particulares? No momento, é muito difícil. “Nós tentamos ver se é realmente possível decodificar apenas pensamentos. E acontece que é um problema muito desafiador. Essa é apenas uma das razões pelas quais, dentre muitas, nos concentramos no que as pessoas estão realmente tentando dizer”, disse Chang.
Contudo, alguns cientistas argumentam que há um debate ético sobre as tecnologias de interface cérebro-máquina que leem a mente.
Embora o novo estudo seja promissor e ofereça esperanças a pacientes com problemas de fala, ainda está em estágios iniciais e, portanto, distante de aplicações clínicas.
Ciberia // HypeScience / BBC