A Academia Sueca, abalada por um escândalo que envolve vazamentos de informação e abusos sexuais que causou o desligamento de cinco membros, pode não atribuir o prêmio Nobel da Literatura em 2018.
Em declarações à televisão SVT, o presidente da Fundação Nobel, Carl-Henrik Heldin, falava depois de a rádio pública SR ter noticiado que várias pessoas do Comitê Nobel e da Academia Sueca consideram que o prêmio não deve ser concedido este ano, para dar tempo à instituição para cicatrizar as feridas e recuperar a confiança da opinião pública.
Assim, seriam outorgados dois prêmios de Literatura em 2019, um dos quais correspondente ao ano anterior, de acordo com uma ideia apoiada por Peter Englund, um dos membros que abandonou a academia.
“Estamos no meio de uma discussão, não vou dizer nada sobre isso, mas dentro de pouco tempo será explicado o que vai acontecer nesse ponto [a eleição do vencedor deste ano]”, disse à emissora Anders Olsson, secretário permanente interino da academia fundada em 1786.
Por sua vez, Per Wästberg, outro membro da academia, disse à SVT que só daqui a algumas semanas poderia dar uma resposta definitiva sobre a questão.
O diretor da instituição, Göran Malmqvist, desmentiu, em contrapartida, à edição digital do diário Dagens Nyheter, que o prêmio não será entregue e, embora admitindo que houve uma proposta nesse sentido, está descartada e garantiu que seria “horrível” se isso acontecesse.
No entanto, a decisão sobre o prêmio deverá ser tomada por todos os membros da academia, sendo o papel principal desempenhado pelo secretário permanente.
Por sete vezes, o Nobel da Literatura, atualmente no valor de 9 milhões de coroas suecas (1 milhão de dólares) não foi atribuído, assim como os das categorias restantes, durante as guerras mundiais do século passado – em 1914 e 1918, em 1935, e depois em 1940, 1941, 1942 e 1943 – mas nunca por outros motivos.
O escândalo começou em novembro, quando o jornal Dagens Nyheter publicou a denúncia anônima de 18 mulheres de abusos e agressões sexuais contra o dramaturgo Jean-Claude Arnault, ligado à academia através de seu clube literário e marido de um dos seus membros, Katarina Frostenson.
A academia cortou todas as ligações a Arnault e encomendou uma auditoria independente sobre suas relações com a instituição, mas divergências internas quanto às medidas a adotar desencadearam demissões, acusações e a saída de cinco membros, entre os quais a secretária permanente em exercício, Sara Danius, e Katarina Frostenson.
Na quinta-feira passada, os membros que continuam a ocupar suas cadeiras na academia decidiram divulgar os resultados da auditoria e entregá-los às autoridades, além de anunciar reformas.
O relatório rejeita que Arnault tenha influenciado decisões sobre prêmios e subsídios, embora o apoio econômico que recebeu viole as regras de imparcialidade, pelo fato de sua mulher ser coproprietária da empresa que geria o clube literário; e confirma que a confidencialidade sobre o vencedor do Nobel foi violada diversas vezes.
Dentre as mudanças no funcionamento da instituição, destaca-se a reforma dos estatutos proposta pelo rei Carlos XVI Gustavo, patrono da academia, para permitir a verdadeira renúncia de seus membros, por desejo próprio ou após dois anos sem participarem ativamente, e a possibilidade de serem substituídos.
Até agora, as renúncias são simbólicas, porque a ligação com a academia é vitalícia e só são eleitos novos membros quando vaga alguma cadeira por morte do respectivo ocupante.
Essas últimas cinco demissões (somadas à ausência de duas autoras que há vários anos boicotam a entidade, por outros motivos) deixaram a instituição com apenas 11 dos 18 assentos ocupados, um a menos que os necessários para eleger novos membros e tomar decisões, como a entrega do Nobel.
Ciberia, Lusa // ZAP