O escritor J. P. Cuenca foi censurado por uma decisão judicial e terá sua conta do Twitter suspensa após o juiz da comarca de Campos dos Goytacazes (RJ), Ralph Machado Manhães Junior, acatar um pedido de censura movido pelo pastor da Igreja Universal Nailton Luiz dos Santos.
Cuenca havia dito em seu Twitter que “o brasileiro só será livre quando o último Bolsonaro for enforcado nas tripas do último pastor da Igreja Universal”, em referência a um texto de Jean Meslier do século 18. A citação original, em referência à política francesa, diz que “o homem só será livre quando o último rei for enforcado nas tripas do último padre”.
O juíz acata o pedido, afirmando que “não obstante ser reconhecido o direito constitucional da liberdade de expressão, no caso em tela, há a extrapolação do referido direito, pois a postagem do réu é ofensiva e incitatória à prática de crime ao incitar claramente a violência contra grande parte da população”.
Cuenca é alvo de 134 processos iniciados em cidades de 21 estados, e caso seja condenado em todos os casos, deveria pagar mais de R$ 2,3 milhões aos requerentes à indenização. No Acre, uma juíza afirmou que se tratava de um movimento coordenado contra o autor e não acatou o processo.
“É nítido que o ajuizamento em massa de ações contra uma pessoa pública, em outro estado da Federação, lhe trará enormes dispêndios financeiros, ainda mais em sede de juizados especiais, cuja ausência do reclamado às audiências importa em revelia”, afirmou a juíza Isabelle Sacramento Torturela.
Em 2007, a jornalista Elvira Lobato publicou uma reportagem mostrando os negócios da Igreja Universal do Reino de Deus e sofreu com trama parecida: foi processada por 111 fiéis e pastores da instituição religiosa, em cidades diferentes do país, o que contribui para a sua aposentadoria.
Para Fernando Hideo Lacerda, que trabalha na defesa de Cuenca, a decisão judicial “é um verdadeiro atentado contra a liberdade de expressão e contra a essência do Estado democrático de Direito, porque claramente não se trata de um discurso de ódio. Trata-se de uma sátira, uma figura de linguagem, uma abordagem satírica mesmo”, afirmou à Folha.
Em nota, a Universal afirma que não participa das causas e desconhece o conteúdo dos processos. A IURD diz que “não tem como comentar o conteúdo desses processos, porque não é parte nas ações e, assim, não conhece seu teor”. A instituição religiosa ainda reitera que as ações partem da vontade individual dos pastores e “como vítima maior do preconceito religioso no Brasil, a Universal preza e defende todas as liberdades asseguradas pela Constituição Federal”.
A IURD adiciona: “Todos estão submetidos às normas constitucionais e às leis —até mesmo os escritores e os jornalistas, que não são detentores de uma liberdade de expressão absoluta que os coloque acima da honra e da dignidade dos demais brasileiros. Não existe direito adquirido para ofender, promover o ódio e espalhar o preconceito contra os cristãos”.
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