Uma das coisas mais chatas sobre o tempo é que ele só viaja para a frente, não é mesmo? Bom, pelo menos para nós. No mundo quântico, muita coisa maluca pode acontecer.
Uma equipe de físicos russos e americanos, por exemplo, conseguiu quebrar a segunda lei da termodinâmica e, quando eu explicar o que isso significa, você vai ficar impressionado.
Segunda lei da termodinâmica
A segunda lei da termodinâmica postula que “a quantidade de entropia de qualquer sistema isolado termodinamicamente tende a aumentar com o tempo, até alcançar um valor máximo”. (Caso você esteja se perguntando, a primeira lei da termodinâmica dita que “a variação de energia interna de um sistema é dada pela diferença entre o calor trocado com o meio exterior e o trabalho realizado no processo termodinâmico”).
No entanto, os próprios cientistas admitem que essa lei pode ser encarada mais como um princípio que guia o universo. Ainda assim, é um princípio muito generalizado.
É por causa dele que coisas quentes esfriam ao longo do tempo, que um ovo mexido não pode ser “desmexido”, que não podemos criar uma máquina de movimento perpétuo e que podemos lembrar o que comemos no Natal passado, mas jamais o que comeremos no próximo Natal.
“Essa lei é a coisa mais próxima que temos da noção de ‘flecha do tempo’ que postula uma direção única do passado para o futuro”, explicou o físico quântico Gordey Lesovik, do Instituto de Física e Tecnologia de Moscou (Rússia).
No mundo quântico…
No mundo macro dos ovos mexidos e Natais em família, realmente não dá para esperar ver as coisas andando para trás. Porém, se focarmos no domínio das coisas minúsculas, como elétrons solitários, podemos ter boas surpresas.
Os detalhes desses elétrons – que são como pedaços de informação que ocupam espaço – são definidos por uma equação muito estranha da mecânica quântica, chamada de “equação de Schrödinger”. Ela descreve como o estado quântico de um sistema físico muda com o tempo.
Você já deve ter ouvido o nome do físico austríaco Erwin Schrödinger antes, só que por outro motivo: seu famoso gato. O experimento mental conhecido como “gato de Schrödinger” serve justamente para ilustrar esses efeitos malucos da mecânica quântica difíceis de entender quando pensamos no mundo muito maior no qual vivemos.
Se a equação fosse aplicada a objetos do dia a dia, como gatos, isso significaria que um gato dentro de uma caixa (o qual não estamos vendo) poderia estar tanto vivo quanto morto ao mesmo tempo. É isso mesmo. E se quiséssemos abrir a caixa para dar uma olhada e verificar essa informação, interferiríamos neste estado ambíguo e seríamos, em tese, responsáveis pelo gato agora estar definitivamente vivo ou morto.
Com elétrons a coisa é menos sombria; a equação de Schrödinger mede as possibilidades entre determinadas características dos elétrons, como sua posição e velocidade. Só que, se calcularmos sua velocidade, não saberemos sua posição e vice versa.
Bom, pelo menos no geral. A questão sobre a equação de Schrödinger é que ela é reversível. De acordo com o cientista de materiais Valerii Vinokur, do Laboratório Nacional de Argonne (EUA), matematicamente, isso significa que, sob uma certa transformação chamada conjugação complexa, a equação pode descrever um elétron que já viajou localizado de volta em determinada região do espaço, durante o mesmo período. Como uma bola branca de bilhar que você já lançou pela mesa retornando a sua mão.
Entra o computador quântico
Claro, tal conjugação complexa é bem rara. Na teoria, ela pode ocorrer espontaneamente, mas precisaríamos observar dez bilhões de elétrons a cada segundo por todo o tempo que nosso universo existe (mais de 13 bilhões de anos, para sua informação) para ver isso acontecer uma única vez.
Não rola sentar e esperar, não é mesmo? É por isso que os pesquisadores utilizaram um computador quântico como sua “máquina do tempo” personalizada. Os qubits serviram como estados possíveis de elétrons e, uma vez que o computador entrou em ação, esses estados se arranjaram em diversas possibilidades.
Como a equação reversível não ocorre tão fácil, os físicos configuraram o computador para aumentar as chances dos elétrons “rebobinarem” no tempo, iniciando o computador novamente em seguida.
Em cerca de 85% dos testes baseados em apenas dois qubits, eles de fato “voltaram” no tempo, como bolas de bilhar espalhadas retornando a uma pirâmide de início de jogo.
Aplicações
Em termos práticos, os algoritmos utilizados neste estudo para manipular a equação de Schrödinger podem ajudar os cientistas a tornar os computadores quânticos mais precisos.
Além disso, experimentos que forçam os limites das leis da física, mesmo em escalas quânticas, permitem que compreendamos melhor por que o universo “flui” do jeito que faz.
Um artigo sobre a pesquisa foi publicado na revista científica Scientific Reports.