O norte de Espanha foi palco de uma nova descoberta paleontológica. Foram encontrados ovos de 68 milhões de anos atrás, que podem conter embriões desses enormes répteis.
José Manuel Gasca estava fazendo jogging um dia no final de 2019 na Serra de Loarre, na província de Huesca, Espanha. Naquele dia, Gasca ultrapassou todos os seus colegas de equipe do Clube Universitário Alpino. No entanto, ele parou, pois algo lhe chamou a atenção.
Eram algumas rochas. Gasca, além de ser um corredor, é um paleontólogo, membro da Área de Cristalografia e Mineralogia da Universidade de Zaragoza. Viu algumas pedras que pareciam rochas de rio, e que em sua opinião eram capazes de conter fósseis de vertebrados. E não eram apenas pedras, eram cascas de ovos de dinossauro.
O cientista enviou imediatamente uma mensagem ao colega dr. Miguel Moreno-Azanza. Nascido em Huesca, nordeste de Espanha, o paleontólogo vive em Portugal, onde faz parte da equipe de pesquisa da Universidade Nova de Lisboa. Assim que recebeu a notícia, Moreno-Azanza não hesitou em ir às montanhas de Loarre.
“Ele [Gasca] me disse para voltar para a Espanha quando eu pudesse. Depois de quinze dias, peguei o primeiro voo que pude e fui avaliar o local”, disse Moreno-Azanza à Sputnik Mundo.
“Quando o examinei, vi que seu potencial era incrível. Sem dúvida, tinha que ser escavado”, acrescentou.
Uma equipe formada por paleontólogos do Grupo Aragossauros-Instituto Universitário de Investigação de Ciências Ambientais de Aragão da Universidade de Zaragoza e da Universidade Nova de Lisboa, foi à área para iniciar os trabalhos de extração. Liderado por Gasca e Moreno-Azanza, o grupo localizou inicialmente uma grande quantidade de restos de conchas e ovos de dinossauro completos.
Segundo Moreno-Azanza, existem mais de 20 ovos esféricos, de 20 centímetros de diâmetro, em “muito bom estado de conservação”, que pertencem aos saurópodes titanossauros, uma espécie de herbívoro quadrúpede com cauda e pescoço longos, que poderia atingir 20 metros de comprimento.
Eles teriam sido agrupados em quatro ninhos diferentes e bem definidos, o que significa que seria encontrado um contingente científico sobre uma vasta área de nidificação de dinossauros que remonta a 68 milhões de anos atrás.
“Até agora, surgiram cerca de 20 ou 25 ovos, mas pode haver cerca de uma centena na área de trabalho definida”, teoriza o paleontólogo da universidade portuguesa.
Os cientistas trabalham em grupos de oito para poder descansar das posturas desconfortáveis que adotam no local, incluindo o uso de serras radiais e martelos pneumáticos, devido à dureza da pedra e a onipresença da máscara, do gel hidroalcoólico e de telas.
O novo coronavírus aparece até mesmo nas escavações, já que os especialistas realizam ao mesmo tempo um trabalho de coleta de dados para poder acompanhar a partir de casa, no caso de estarem confinados.
“Sem dúvida, esta não é uma escavação com pincel como as [escavações] de filmes”, brincou o arqueólogo.
Uma vez extraídos, os ovos serão levados para laboratório para análise e posterior preparação dos restos, com vista a uma futura exposição. Com um pouco de sorte, eles esperam encontrar um embrião de dinossauro que não tenha eclodido.
“Este seria um achado único. Na Europa, eles nunca foram encontrados. Os únicos que existem estão na América do Sul”, explica Moreno-Azanza.
Mesmo sem embriões, a descoberta é considerada de elevada importância. Octávio Mateus, líder da equipe de pesquisa de vertebrados da Universidade Nova de Lisboa, destaca a importância desta descoberta, comparando-a com os ovos de dinossauros encontrados em Portugal, que são duas vezes mais antigos. Moreno-Azanza assinala que, embora seu tamanho não seja excepcional, ajudará a resolver várias questões sobre a presença dessas criaturas na região.
“Não é o maior do mundo, pois existem locais semelhantes de grande extensão em Lleida [província oriental espanhola de Catalunha]. Mas o que nós não sabíamos é que poderia haver rochas com dinossauros. Tivemos a ideia, de fato, de que alguns ossos haviam sido encontrados, mas isto já certifica que havia dinossauros nas montanhas exteriores de Huesca”, confirma o cientista.
O lugar pode ser a chave para desvendar o processo de nidificação dos últimos dinossauros que povoaram a Europa, e pode ser uma pista para encontrar mais restos.
A notícia foi bem recebida por Loarre. O prefeito, Roberto Orós, colocou à disposição dos cientistas toda a ajuda logística. De acordo com Moreno-Azanza, o governador está entusiasmado com o projeto na cidade, que já abriga uma área de rinocerontes.
“Loarre é ideal para encontrar este local, porque eles sabem o que significa viver do turismo. A prefeitura nos deu o dobro do que precisávamos. Eles nos receberam no albergue e estão todos interessados. É um lugar onde nenhum trabalho didático tem que ser feito para mostrar a importância da descoberta”, aponta o paleontólogo.
Loarre é famosa por seu castelo medieval. Em sua sombra cresce a vila, que em 2020 celebra um milênio desde a construção da fortaleza.
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