Pela primeira vez, pesquisadores conseguiram observar os “tsunamis cerebrais” que acontecem no cérebro no exato momento em que a morte se torna irreversível, analisando o fenômeno em pacientes terminais enquanto morriam no hospital. Afinal, irreversível pode ser uma ideia muito relativa.
Talvez nunca poderemos de fato saber o que realmente acontece na hora de nossa morte, mas um grupo de cientistas da Universidade Charitée, em Berlim, junto com uma equipe da Universidade de Cincinnati, nos EUA, decidiram desenvolver um estudo pioneiro sobre o tema, monitorando o sistema nervoso e o cérebro de pacientes terminais durante seus falecimentos.
A pesquisa, liderada pelo cientista Jens Dreier e publicada em janeiro na revista Annals of Neurology, foi realizada com a devida autorização das famílias dos pacientes, vítimas em geral de acidentes de carro, AVCs ou paradas cardíacas – pessoas que não tinham mais salvação.
O propósito da pesquisa não era somente o de compreender o funcionamento cerebral na hora da morte, mas também de possivelmente salvar vidas no futuro. Trata-se do primeiro estudo a realmente documentar a sequência de eventos cerebrais durante a morte.
A equipe de pesquisadores queria ter mais detalhes sobre o que acontece com o cérebro dos humanos, algo que ainda estava cheio de enigmas. Para isso, à medida que o paciente terminal piorava, os cientistas monitoraram sua atividade neurológica usando dezenas de eletrodos.
De maneira geral, os neurônios funcionam com íons carregados, o que cria desequilíbrios elétricos entre eles e seu ambiente – isso permite que pequenos choques, ou sinais, sejam criados. Para os autores do estudo, a manutenção desse sistema fica mais difícil quando a morte está chegando.
Para se alimentar, essas células “bebem” oxigênio e energia química da corrente sanguínea. Quando o corpo morre e o fluxo de sangue que chega ao cérebro para, os neurônios – privados de oxigênio – tentam uma de suas últimas saídas: acumular os recursos que sobraram, dizem os pesquisadores.
O que sabíamos até então sobre morte cerebral era a partir de pesquisas com animais e, ainda que a nova pesquisa revele que a morte para nossos cérebros seja similar à morte em animais, o cérebro humano naturalmente traz especificidades e complexidades peculiares – e incríveis.
Uma das primeiras descobertas é do esforço enorme que os neurônios realizam a fim de tentarem manter-se vivos – e, diante da falta de oxigênio e energia química pela ausência de fluxo sanguíneo, os neurônios se silenciam, a fim de acumularem e salvarem os recursos que lhes restam.
A energia é utilizada não para enviar sinais, como normalmente fazem, mas sim para manter cargas elétricas internas, mantendo o cérebro “vivo” a espera de um novo fluxo sanguíneo – que infelizmente não virá. Esse fenômeno incrível foi batizado de “depressão não dispersa”, pois acontece no cérebro como um todo.
Em seguida, no entanto, o inevitável: uma grande liberação dessa energia térmica, conhecida como “despolarização da difusão” ou “tsunami cerebral”, que leva à destruição das células. Conforme os níveis de oxigênio caiam nos pacientes monitorados, caia também as atividades cerebrais.
É então que a morte chega.
“A despolarização expansiva marca o início das mudanças celulares tóxicas que eventualmente levam à morte, mas não é o ponto chave da morte por si só, pois essa despolarização é reversível até certo ponto, com a restauração do suprimento de energia”, diz Jens Dreier.
Os resultados da pesquisa parecem apontar que a morte cerebral pode ser reversível. Mas, como diz Dreier, a morte é um fenômeno complexo para o qual não há respostas fáceis.
Ciberia // Hypeness / BBC / Science Alert