Naufrágio que matou ao menos 27 no Canal da Mancha era previsível, denunciam ONGs

 

Maud Veith / SOS Mediterranée

Ativistas do navio Ocean Viking, da ONG SOS Mediterranée, resgatam migrantes no Mar Mediterrâneo

Uma quinta pessoa foi presa na madrugada desta quinta-feira (25), suspeita de tráfico humano e envolvimento no naufrágio que matou 27 migrantes no Canal da Mancha, entre a França e a Inglaterra, na quarta-feira (24). De acordo com o ministro do Interior da França, Gérald Darmanin, o suspeito comprou botes infláveis na Alemanha. Outros quatro supostos coiotes foram presos logo após o drama.

O naufrágio é um dos piores já ocorridos no local. O presidente francês, Emmanuel Macron, e o premiê britânico, Boris Johnson, tiveram uma conversa telefônica sobre o assunto e concordaram em “intensificar os esforços” para enfrentar a crise migratória. Nesta manhã, Londres propôs à França ajudar a aumentar o patrulhamento nas costas francesas, colocando mais “meios” à disposição – a exemplo de um helicóptero britânico que auxiliou as operações de resgate das vítimas.

A tragédia foi descoberta por um pescador, que alertou a guarda costeira após ver corpos boiando no mar. Entre as vítimas, estão um adolescente, três crianças e uma mulher grávida. Duas pessoas foram resgatadas com vida, mas sofrem de hipotermia severa e podem não sobreviver, de acordo com o Ministério do Interior francês.

As associações de ajuda aos migrantes na França responsabilizam as autoridades do país. François Guénoc, presidente da Ong Auberge des Migrants disse, em entrevista à RFI, que o drama poderia ter sido evitado.

Não nos surpreende. Nós observamos que, apesar do inverno, as tentativas de travessia continuavam. Há vários meses, os barcos utilizados são cada vez maiores, com 30, 40, 50 pessoas a bordo – o que indicava que, se um barco naufragasse, automaticamente teríamos muitas vítimas”, relata.

“As autoridades estavam sabendo de toda a situação. Infelizmente estamos pessimistas. As primeiras reações do governo nos fazem pensar que nada vai mudar: eles acusam os coiotes, mas se tem traficantes é porque a fronteira está bloqueada e os britânicos não oferecem mais possibilidades de passagem legal para a Grã Bretanha.”

Imprensa relembra dramas

O naufrágio é destaque na imprensa francesa desta quinta-feira. “Uma tragédia humanitária de uma dimensão inédita chegou brutalmente no litoral norte da França”, diz o jornal Le Parisien, lembrando que este tipo de incidente é comum nas costas do Mediterrâneo. Alguns dramas ficaram marcados na memória, como o do “pequeno Aylan” o menino sírio de três anos, cujo corpo sem vida foi encontrado em uma praia turca.

“Após terem percorrido a Europa, provavelmente para fugir da guerra, perseguições ou simplesmente para construir um futuro mais próspero, eles sonhavam em chegar ao Reino Unido, país visto por eles como um oásis de empregos”, diz o jornal. “Agora seus corpos estão em um hangar sem alma, em Calais”, lamenta o Parisien, que fala em “um drama previsível”.

Há 15 anos, ressalta, as políticas de imigração francesas não foram capazes de acabar com o fluxo de migrantes e refugiados no norte do país. “Eles ainda são milhares amontoados em campos (…) sonhando em atravessar os 43 km que os separam das falésias de Douvres, na Inglaterra.”

Aumento da segurança

O presidente francês Emmanuel Macron reagiu à tragédia dizendo que a “França não deixará que a Mancha se transforme em um cemitério”. “Essa retórica exaspera as associações humanitárias”, diz o jornal Le Monde. As ONGs acusam os governos e o excesso de segurança nas fronteiras europeias de terem criado uma rede de tráfico de pessoas. “No começo dos anos 2010, as pessoas passavam sem dinheiro e sem ajuda de intermediários”, disse Vincent de Coninck, do Secours Catholique de Calais, ao Monde.

O fenômeno das travessias na Mancha surgiu quando a segurança no porto de Calais e do túnel da Mancha aumentou, dificultando a passagem dos migrantes em caminhões, observa Le Monde. De acordo com as organizações, os processos de demandas de asilo também se tornaram mais lentos e de difícil aprovação após o Brexit.

Os primeiros elementos da investigação divulgados pela promotoria de Lille indicam que a maioria das vítimas era curda, do Iraque ou do Irã. A embarcação teria saído das proximidades de Loon Plage, em Dunkerque.

Desde 2018, as tentativas de atravessar o canal da Mancha a bordo de embarcações improvisadas despontaram, apesar dos riscos que representam. De acordo com Le Monde, em 2021, 23 mil pessoas conseguiram chegar às costas da Inglaterra e mais de 7 mil foram resgatadas no mar.

// RFI

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