A Rússia anunciou que começará na sexta-feira (23) a retirada de suas tropas das proximidades da fronteira com a Ucrânia e na Crimeia anexada, ao encerrar as manobras militares que provocaram grande preocupação na comunidade internacional.
A presença de dezenas de milhares de soldados perto da Ucrânia – que luta contra os separatistas pró-russos no leste – alimentou as tensões e as críticas recíprocas entre Moscou, de um lado, e os ocidentais e a própria Ucrânia do outro.
Poucas horas antes do anúncio russo, o presidente ucraniano Volodymyr Zelensky elogiou a retirada das tropas russas reunidas perto de seu país, já que “leva a uma redução proporcional da tensão”.
“A Ucrânia continua vigilante, mas fica feliz com qualquer medida que possa reduzir a presença militar”, tuitou o presidente ucraniano.
Kiev expressou o medo de uma “invasão” russa. Moscou afirma que não ameaça ninguém e denuncia provocações ucranianas e as atividades “ameaçadoras” da Otan em suas fronteiras.
A Otan disse, nesta quinta-feira, que tomou nota do anúncio de que a Rússia reduziria as tropas em exercícios militares perto da Ucrânia, mas acrescentou que a aliança “permanece vigilante” e pediu a Moscou que se retire completamente do país.
“Quaisquer medidas para diminuir a escalada por parte da Rússia seriam importantes e bem atrasadas. A Otan permanece vigilante“, disse uma autoridade do órgão em um comunicado. “Continuamos a pedir à Rússia que respeite os seus compromissos internacionais e retire todas as suas forças do território ucraniano.”
“Defesa confiável”
“As tropas demonstraram sua capacidade de garantir uma defesa confiável”, afirmou o ministro da Defesa russo, Serguei Shoigu, em um comunicado, no qual explica que deu a ordem de retorno para suas “bases permanentes” a partir de sexta-feira.
Os soldados mobilizados na Crimeia devem partir até 1º de maio, segundo o ministro.
Shoigou visitou a Crimeia, península anexada pela Rússia em 2014, para acompanhar os exercícios militares em um momento de tensão com Kiev e com os países ocidentais.
O ministério da Defesa informou que as manobras envolveram 10.000 militares, a Aeronáutica, quase 40 navios, defesa antiaérea e tropas aerotransportadas.
A Rússia intensificou nos últimos dias os exercícios no Mar Negro e na Crimeia, depois de mobilizar dezenas de milhares de militares na fronteira com a Ucrânia, país com o qual mantém relações tensas desde 2014.
Moscou também limitou por seis meses a navegação dos navios miliares e oficiais estrangeiros em três regiões na costa da Crimeia, especialmente em torno da península de Kerch.
Esta região é muito polêmica pela sua proximidade com o Estreito de Kerch, que une o mar Negro ao mar de Azov, de importância crucial para as exportações de cereais e de aço produzidos na Ucrânia.
Essas limitações foram classificadas como uma “escalada” por Washington.
O conflito continua
No entanto, apesar da redução das tensões na retirada das tropas russas perto da fronteira com a Ucrânia, o conflito entre Kiev e os separatistas pró-russos no leste do país continua, deixando dezenas de mortos desde janeiro.
Pouco antes do anúncio do fim das manobras russas, militares ucranianos perto da cidade de Pisky, na periferia de Donetsk, um dos feudos dos separatistas pró-russos, expressaram suas dúvidas de que o conflito pudesse ser resolvido com o diálogo.
“É um beco sem saída, ninguém quer resolver o conflito pela via diplomática, mas também ninguém quer a guerra”, disse o militar Kirilo, de 35 anos.
Kirilo expressa também o desejo de que seu país, a Ucrânia, se junte à Aliança Atlântica do Norte.
“Se nos juntarmos à Otan, a Rússia estará cercada pela Aliança em todos os lados e não poderá fazer nada”, insiste outro soldado, que responde pelo nome de guerra “Joker”, de 24 anos.
O conflito no leste da Ucrânia deixa mais de 13.000 mortes desde 2014.
Abertos ao diálogo?
Na terça-feira, o presidente ucraniano convidou seu homólogo russo, Vladimir Putin, para uma reunião na região do front. Zelensky não recebeu ainda uma resposta formal de Moscou.
Mas o presidente russo, Vladimir Putin, se declarou nesta quinta-feira disposto a receber em Moscou “a qualquer momento” seu homólogo ucraniano, Volodymyr Zelensky, para discutir relações bilaterais, mas, sobre o conflito no leste da Ucrânia, Putin sugeriu que ele falasse com os separatistas.
“Se se trata de falar de relações bilaterais, é claro, estamos prontos para receber o presidente ucraniano em Moscou a qualquer momento que ele considerar adequado”, disse Putin, questionado sobre a proposta de reunião feita por Zelensky na terça.
“Houve muitas medidas destinadas a destruir nossas relações, as quais, é claro, não podemos deixar de lamentar. Se o presidente Zelensky quiser começar a restabelecê-las, vamos apenas recebê-lo”, acrescentou Putin à margem de um encontro com seu par bielo-russo, Alexander Lukashenko.
Após uma longa trégua durante o segundo semestre de 2020, os confrontos aumentaram desde o início do ano entre as forças de Kiev e os separatistas.
A tensão aumentou paralelamente nas últimas semanas com o destacamento por Moscou de dezenas de milhares de soldados perto da fronteira com a Ucrânia e na Crimeia, anexada por Moscou em 2014, para exercícios militares.
// RFI