Um mês após atos golpistas, exposição em Brasília celebra a democracia

Joedson Alves / Agencia Brasil

Acervo em exposição traz mais de 200 peças, de 104 artistas –

Exposição gratuita vai até o final do mês, no Museu da República.

Inaugurada no primeiro dia de 2023, a exposição Brasil futuro: as formas da democracia, no Museu Nacional da República (MuN), em Brasília, é um espaço para a reflexão sobre a política nacional e a democracia em permanente construção. Esses temas ganharam novas dimensões após os atentados às sedes dos Três Poderes da República, em 8 de janeiro, que nesta quarta-feira (8) completam um mês.

A mostra, planejada em 2022, no período de transição para o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, foi efetivamente criada para marcar a retomada do setor cultural no Brasil, com a refundação do Ministério da Cultura. A exposição debate ainda aspectos relativos a novos direitos sociais e à pluralidade do país.

A diretora do Museu Nacional da República, Sara Seilert, conta que a exposição ganhou novos contornos e mais importância após os atos golpistas, atraindo um público maior e mais repercussão.

“Estamos atentos e, ainda, em resistência. Porque não é como se a democracia estivesse garantida nesse país. A gente tem que estar o tempo todo em trabalho de luta por essa conquista.”

Sara revelou à Agência Brasil que o Museu Nacional só não foi depredado, naquele domingo, porque houve agilidade para fechar as portas, logo que perceberam a grande movimentação de extremistas a caminho da Esplanada dos Ministérios.

Para a historiadora e antropóloga Lilia Schwarcz, uma das curadoras da mostra, o impacto dos atentados à democracia é imenso, mas a tornará ainda mais forte.

“Nos momentos que parecem de maior plenitude da democracia, existem sempre ameaças golpistas, autoritárias, que vêm aí mostrar como este é um regime que precisa ser cuidado, amparado e aprimorado também”.

Lilia fez a curadoria da exposição ao lado do arquiteto Rogério Carvalho; do secretário-executivo do Ministério da Cultura, Márcio Tavares; além da contribuição do ator e comediante Paulo Vieira.

“A gente tentou trazer a potência dos trabalhos dos artistas no sentido de projetar uma sociedade mais democrática, porque é mais plural e mais inclusiva. (…) Nossa intenção foi trazer esses agentes sociais se fortalecendo, se projetando na redemocratização e que resumem essa sociedade tão diversa, plural”.

Joedson Alves / Agência Brasil

Acervo

Até 26 de fevereiro, quem for ao museu, no centro da capital, pode conferir as mais de 200 obras de 104 artistas, que buscam celebrar a democracia, transformando o museu em espaço de diálogo. O público é convidado a refletir sobre a riqueza de gênero, étnica, regional e de linguagens presentes na cultura do Brasil.

As peças estão expostas na instituição em três núcleos:

  • Retomar Símbolos: para mostrar que ícones da nação brasileira, como a bandeira nacional e suas cores – verde e amarelo –, não podem ser sequestradas por um grupo ou setor. Os símbolos são de todos;
  • Descolonizar: para questionar o passado autoritário, de colonização europeia, escravidão, exploração dos povos originários e exclusão de mulheres e orientação de gênero;
  • Somos Nós: para refletir a pluralidade da sociedade, com experiências sobre o que é ser um brasileiro, uma brasileira.

Sobre as artes visuais em exposição – como telas, esculturas, bordados e colagens –, algumas foram cedidas por artistas contemporâneos e outras compõem o acervo do próprio Museu da República e da Presidência da República.

Um dos quadros destacados no centro da exposição, no núcleo Somos Nós, tem o título A Queda do Céu e a Mãe de Todas as Lutas, da ativista Daiara Tukano. Nascida em São Paulo e residente em Brasília, a artista e educadora pintou a tela de 4 metros (m) por 2m no próprio espaço, especialmente para o evento. No site da artista, ela afirma que “honrar a verdade e a memória de nosso povo é seguir nossa luta e celebrar nossa identidade”.

Clique aqui e confira a programação completa do Museu Nacional da República.

Público

Um mês após os ataques à democracia, a estudante de Relações Internacionais, em São Paulo, Stefanie do Nascimento teve a oportunidade de conferir as obras da exposição e se impressionou com a pluralidade retratada. “Como militante, eu acho incríveis as manifestações em prol da democracia. Eu acho importante, principalmente, para as futuras gerações.”

Já o professor do ensino fundamental da rede pública em Brasília Amauri Barbosa de Amorim tirou fotos das obras e defendeu a liberdade de expressão.

“A arte sem questionar, sem refletir, não é arte. A arte em si é o que é porque questiona, porque reflete. Ela faz com que as pessoas reflitam sobre os temas da atualidade, no caso a democracia. A política nos tempos de hoje é muito importante e fundamental para nossa sociedade.”

A designer Vitória Giácomo se disse impactada com o que viu. “Achei simbólico já começar o ano falando de tudo o que tem que falar, mexendo em tudo que precisa ser mexido e retomar todos esses temas que não estavam sendo falados”.  Para ela, os vândalos que invadiram e depredaram o centro de Brasília, no último dia 8, deveriam visitar a exposição e estudar sobre o que os artistas produzem e trazem para a discussão”.

A estudante Catarina Antunes que cursa Teoria Crítica e História da Arte, em Brasília, visitou o espaço e conta que enxergou lições para o futuro do país, a partir da tentativa de golpe.

“A gente tem essa esperança de que não aconteça mais porque as pessoas entenderem que não é assim que é feita a democracia. A democracia é livre arbítrio, todo mundo em conjunto fazendo uma escolha. E se foi feita essa escolha [eleger o presidente Lula], tem que ser respeitada assim, como foi respeitada antes. O respeito tem que prevalecer no país”, finaliza Catarina.

Serviço

Data: até 26 de fevereiro
Horário: das 9h às 18h30, de terça-feira a domingo
Visitação gratuita
Local: Museu Nacional da República – Setor Cultural Sul, Lote 2. Ao lado da Catedral e próximo à Rodoviária do Plano Piloto, em Brasília (DF)

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