Uma equipe de cientistas mediu com sucesso partículas de luz sendo “comprimidas” – ou “espremidas” – em uma experiência que havia sido descrita nos livros didáticos de física como impossível de observar.
Esta compressão é um estranho fenômeno da física quântica, criando uma forma muito específica de luz de “baixo ruído” e sendo potencialmente útil na tecnologia projetada para captar sinais fracos, como a detecção de ondas gravitacionais. O método padrão de compressão de luz envolve disparar um feixe de laser intenso em um material, geralmente um cristal não linear, que produz o efeito desejado.
Por mais de 30 anos, no entanto, existe uma teoria sobre outra técnica possível. Ela envolve excitar um único átomo com apenas uma pequena quantidade de luz. A teoria afirma que a luz dispersa por este átomo deve, da mesma forma, ser comprimida. Infelizmente, embora a base matemática para esse método – conhecido como compressão da ressonância de fluorescência – tenha sido elaborada em 1981, o experimento para observá-lo era tão difícil que um consagrado livro de física quântica conclui: “Parece impossível medi-lo”.
E assim era – até agora.
Num artigo publicado na revista “Nature”, uma equipe de físicos relata que conseguiu demonstrar com sucesso a compressão das partículas de luz, ou fótons individuais, usando um átomo construído artificialmente, conhecido como um ponto quântico semicondutor.
Graças às propriedades ópticas melhoradas deste sistema e da técnica utilizada para fazer as medições, os cientistas foram capazes de observar a luz que foi dispersa, e provaram que tinha, de fato, sido comprimida.
Fazendo o impossível possível
De acordo com o professor Mete Atature, do Departamento de Física da Universidade de Cambridge, que liderou a pesquisa, este é “um daqueles casos de uma questão fundamental que os teóricos elaboraram, mas que, depois de anos de tentativas, as pessoas basicamente concluem que é impossível ver de verdade”.
“Conseguimos fazê-lo porque agora temos átomos artificiais com propriedades ópticas que são superiores aos átomos naturais”, explica em entrevista ao site Phys.org. “Isso significa que fomos capazes de alcançar as condições necessárias para observar essa propriedade fundamental de fótons e provar que este fenômeno ímpar de compressão realmente existe no nível de um único fóton. É um efeito muito bizarro que vai completamente contra nossos sentidos e expectativas sobre o que os fótons devem fazer”.
Conceitos complicados
Como muito na física quântica, os princípios por trás do feito envolvem alguns conceitos praticamente incompreensíveis.
Tudo começa com o fato de que, onde quer que haja partículas de luz, também existem flutuações eletromagnéticas associadas. Esta é uma espécie de estática a que os cientistas se referem como “ruído”. Tipicamente, quanto mais intensa a luz, maior será o ruído. Diminuindo a luz, o ruído também diminui.
Mas, estranhamente, a um nível quântico muito fino, esta figura muda. Mesmo numa situação em que não existe luz, ainda existe ruído electromagnético. Isso é chamado de flutuações do vácuo. Enquanto a física clássica nos diz que na ausência de uma fonte de luz estaremos na escuridão perfeita, a mecânica quântica nos diz que sempre há um pouco desta flutuação ambiente.
“Se você olhar para uma superfície plana, parece lisa, mas sabemos que, se você realmente aumentar o zoom para um nível super-fino, ela provavelmente não é perfeitamente lisa”, disse Atature. “A mesma coisa está acontecendo com flutuações do vácuo. Uma vez que você entra no mundo quântico, você começa a ter esta impressão fina. Parece que há zero fótons presente, mas, na verdade, há apenas um pouquinho mais do que nada”.
É importante ressaltar que essas flutuações do vácuo estão sempre presentes e fornecem um limite de base para o ruído de um campo de luz. Mesmo lasers, a fonte luminosa mais perfeita conhecida, carregam este nível de ruído flutuante.
É aí que as coisas ficam ainda mais estranhas, porém, porque, nas condições quânticas certas, esse limite base do ruído pode ser reduzido ainda mais. Este estado “menor do que nada” ou “menor do que o vácuo” é o que os físicos chamam de compressão.
No experimento de Cambridge, os pesquisadores conseguiram isso ao lançar um feixe de laser fraco sobre seu átomo artificial, o ponto quântico. Isso excitou o ponto quântico e levou à emissão de um fluxo de fótons individuais. Embora normalmente o ruído associado a essa atividade fotônica é maior do que um estado de vácuo, quando o ponto foi excitado apenas um pouco, o ruído associado com o campo luminoso realmente caiu, tornando-se menor do que a suposta linha de base de flutuações do vácuo.
O porquê
Explicar por que isso acontece envolve física quântica altamente complexa. Em seu núcleo, no entanto, está uma regra conhecida como princípio da incerteza de Heisenberg. Isto indica que, em qualquer situação em que uma partícula tem duas propriedades ligadas, apenas uma pode ser medida e a outra tem de ser incerta.
No mundo normal da física clássica, esta regra não se aplica. Se um objeto está se movendo, podemos medir a sua posição e seu momento linear, por exemplo, para entender onde está indo e quanto tempo provavelmente levará para chegar lá. A dupla de propriedades – posição e momento – está conectada.
No estranho mundo da física quântica, no entanto, a situação muda. Heisenberg afirma que apenas uma parte de uma dupla pode ser medida, e a outra deve permanecer incerta. No experimento de Cambridge, os pesquisadores usaram essa regra a seu favor, criando um equilíbrio entre o que poderia ou não ser medido. Ao espalhar a fraca luz do laser do ponto quântico, o ruído de uma parte do campo eletromagnético foi reduzido a um nível extremamente preciso e baixo, abaixo da linha de base padrão de flutuações do vácuo. Isso foi feito à custa de tornar outras partes do campo eletromagnético menos mensuráveis – o que significa que se tornou possível criar um nível de ruído que era “menor do que nada” em conformidade com o princípio da incerteza de Heisenberg, e, portanto, as leis da física quântica.
A determinação da incerteza com que as flutuações do campo electromagnético podem ser medidas num gráfico cria uma forma em que a incerteza de uma parte é reduzida, enquanto a outra é estendida. Isso cria uma forma “espremida” ou “comprimida”, daí o termo “espremer” a luz.
Atature acrescenta que o objetivo principal do estudo era simplesmente tentar ver essa propriedade de fótons individuais, porque ela nunca tinha sido observada antes. “É o mesmo que querer olhar para Plutão em mais detalhes ou estabelecer que pentaquarks existem”, conta. “Nenhuma dessas coisas tem uma aplicação óbvia agora, mas o objetivo é saber mais do que sabíamos. Fazemos isso porque somos curiosos e queremos descobrir coisas novas. Essa é a essência do que é a ciência”