“’Mendigo’ tem nome, tem família e tem uma história”. É assim que pensam três jovens dentistas de Piracicaba, no interior de São Paulo. Além dos clientes comuns, eles se uniram para atender pessoas necessitadas, pacientes em situação de vulnerabilidade social, como dizem.
Renan Pereira, de 24 anos – fundador e coordenador do projeto –, a namorada dele, Maira Lache, 24 anos, e Pedro Ferreira, de 25, fazem esse trabalho voluntário há um ano. “Fazemos exodontias [extração de dentes], restaurações, próteses, procedimentos endodônticos [canais], tratamentos periodontais e tratamentos preventivos”, contou Pereira ao SNB.
De onde eles tiram o dinheiro? Adivinha! “Nós bancamos do próprio bolso. Todos os gastos altos que temos nós dividimos entre os integrantes para não pesar para ninguém. Alguns materiais que nós utilizamos no projeto são materiais que nós já temos, o que facilita muito”, explica Pereira.
Os três amigos já atenderam 30 pacientes em situação de rua no Projeto Conexão Saúde, a maioria de Piracicaba. Em média são três pessoas por mês. Agora eles querem ampliar o projeto e transformá-lo em uma organização não governamental (ONG).
Um deles é o seu José (foto acima), um senhor de Pirassununga que foi tentar a vida em Campinas, mas hoje vende produtos no semáforo até tarde da noite, para sustentar a mulher e duas filhas.
Ele contou aos dentistas que gosta de música, de cantar e de sorrir, mas a falta de vários dentes impedia que ele arrumasse emprego. Então os dentistas investiram para dar um novo sorriso ao seu José. Eles fizeram “extrações de dentes condenados, restaurações e uma prótese removível superior”.
Hoje ele parece outro homem. O tratamento terminou há duas semana e a expectativa para arrumar um novo emprego agora é grande. “Ele era alguém que sorria muito, mesmo sem ter um ”sorriso bonito”, sem ter os dentes da frente. Acredito que a gente deu mais segurança pra ele nesse ato”, contou Pereira.
Os integrantes do projeto escolhem os pacientes de forma aleatória, quando caminham pelas ruas de Piracicaba e Campinas. “Selecionamos os que estão em situação mais delicada, nos aproximamos e conversamos. Se eles nos dão abertura, fazemos o convite para o tratamento e atendemos nos nossos consultórios”, disse.
Os três dentistas faziam o trabalho voluntário separadamente, mas conversando sobre suas experiências, eles resolveram unir forças em 2016. Renan conta que a ideia surgiu quando ele percebeu que o Brasil tem tanto dentista e ao mesmo tempo tanta gente precisando tratar dos dentes.
“Essa minha inquietude com as pessoas em situação de rua começou quando eu descobri que o Brasil é o país com maior numero de dentistas do mundo, mas isso não se refletia numa sociedade com maior qualidade na saúde oral. Mesmo com tanta gente, nós ainda temos uma parcela gigantesca de pessoas que nunca foram atendidas”, conta.
“Isso é bizarro, leva a gente a refletir para quem estamos fazendo odontologia. É uma forma de retornar o conhecimento que recebi todos esse anos”, afirma.
E mais do que um trabalho social, essa ajuda se tornou um aprendizado para os jovens dentistas. “O interessante mesmo é o histórico de vida deles. São histórias que nos dão verdadeiros choques de realidade”, conclui.