Donos de um frigorífico e de um curtume disseram ao Fantástico que precisaram pagar propina para que pudessem manter as indústrias em Mato Grosso do Sul. Um dos empresários chegou a gravar a entrega de propina. O esquema, segundo a denúncia, envolve a alta cúpula do governo estadual.
Entre os envolvidos estariam o governador Reinaldo Azambuja, do PSDB, e o ex-secretário de Estado da Casa Civil, Sérgio de Paula, do mesmo partido. Azambuja nega. Sérgio de Paula, que deixou o governo em março após a fusão da Casa Civil com a Secretaria de Estado de Governo, afirmou que nunca autorizou ninguém a usar o nome dele.
Os empresários alegam terem sido obrigados a participar do esquema. “Nós não tínhamos saída”, afirma Benilson Tangerino, dono de um frigorífico há nove anos.
José Alberto Berger, que tem a fábrica que processa couro de gado há 12 anos, também disse ter sido extorquido pelo governo sul-mato-grossense. Segundo ele, no dia 4 de novembro, o governo mandou um e-mail, apontando irregularidades na fábrica dele e suspendendo a autorização para compra de gado.
Em busca de explicações, ele afirma ter procurado o governador. Azambuja pediu para ele falar com Sérgio de Paula, que na época ainda comandava a Casa Civil, uma pasta de caráter político com a função de ajudar o governo a gerenciar e integrar todas as secretarias.
Sérgio de Paula pediu para o assunto ser tratado por meio de um mensageiro, chamado José Ricardo Guitti, o Polaco. De acordo com o empresário José Alberto Berger, Polaco falava abertamente que era necessário pagar propina para o negócio funcionar “amigavelmente”.
Ele afirmou que já tinha entregado R$ 250 mil de propina, quando Polaco pediu mais. No dia 10 de novembro, entregou mais R$ 250 mil. No mesmo dia, o governo informou que estava reativada a licença de compra e venda.
De acordo com José Alberto Berger, o dinheiro iria para Sérgio de Paula, com aval do governador Reinaldo Azambuja. “Segundo o mensageiro, ele [Azambuja] autorizou fazer o acerto. Foi com aval dele”, disse.
A extorsão, no entanto, recomeçou e o empresário decidiu gravar tudo. No dia 8 de dezembro de 2016, Polaco recebeu R$ 30 mil e o empresário perguntou se Sérgio de Paula iria ajudar a empresa e comentou que, “pra pegar grana, ele [o ex-secretário] é um leão”. “Ah, nossa senhora, é um leão”, responde Polaco.
Ainda conforme o empresário, o governo queria cobrar uma mensalidade dos empresários no valor de R$ 150 mil por mês. Ele não aceitou e o curtume perdeu a autorização de novo e foi multada em R$ 7 milhões por uma suposta sonegação fiscal. O empresário precisou recorrer à Justiça para continuar o negócio.
“Nós fomos vítimas de uma ação predatória do governo. Eu jamais esperava isso”. A afirmação é do presidente da Assocarnes [Associação de Matadouros, Frigoríficos e Distribuidores de Carne], João Dias.
Polaco disse não ter participado do esquema criminoso. “Não levei pra ninguém o dinheiro. Não existe esse dinheiro, tá?”. Segundo as investigações, ele é gerente de fazenda de um amigo do governador Azambuja.
O chefe do Executivo também negou veementemente a participação no esquema.
“Eu não posso dar credibilidade a pessoas que são fraudadores. Comprovadamente fazem emissão de nota fria para querer se salvar do pagamento de imposto no Mato Grosso do Sul. O Estado identificou isso, cancelou o incentivo que vinha do governo anterior e nós estamos muito tranquilos quanto a isso. Quanto a questão de vídeo, de gravação, cada um vai responder por aquilo”, disse. Os empresários negam a sonegação.
Azambuja disse ainda que se Sérgio de Paula usou o nome dele, foi sem sua autorização.
Em nota, Sérgio de Paula afirmou que nunca autorizou ninguém a usar o nome dele e que, em nenhum momento, foi contemplado com dinheiro ou qualquer espécie de benesse vinda de José Ricardo Guitti, o Polaco.
Quanto ao empresário José Alberto Berguer, Sérgio de Paula afirmou que foi procurado por ele para interceder junto a Secretaria Estadual de Fazenda, mas deixou claro que não tinha qualquer tipo de relação ou poder para tentar mudar decisão sobre cortes de benefícios fiscais.
José Alberto Berger e o presidente da Associação de Frigoríficos disseram que vão apresentar as denúncias e o vídeo da propina ao Ministério Público Federal. O caso deve ser investigado pela Procuradoria-Geral da República.
O governador enfrenta pedidos de impeachment na Assembleia Legislativa por conta de um vídeo de uma delação da Operação Lava Jato em que Wesley Bastista, dono da JBS, disse ter pagado propina para o atual governo em troca de descontos nos impostos estaduais.
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