Rajadas rápidas de rádio ajudarão a mapear distribuição de matéria no universo

O novo levantamento dos dados coletados pelo radiotelescópio CHIME (Canadian Hydrogen Intensity Mapping Experiment) resultou em mais de 500 rajadas rápidas de rádio devidamente catalogadas, todas feitas durante o primeiro ano de atuação do telescópio.

Agora, esses resultados foram apresentados no American Astronomical Society Meeting (AAS), onde os pesquisadores puderam compartilhar suas considerações sobre o tema.

Esses disparos explosivos em ondas de rádio, também conhecidos como FRBs (da sigla em inglês para Fast Radio Burts), são muito intensos e liberam quantidades enormes de energia pelo universo, mesmo com duração de apenas alguns milésimos de segundo. Já se passaram cerca de 15 anos desde que os astrônomos começaram a investigar esse fenômeno, mas até hoje não há certeza sobre a fonte das rajadas.

Pesquisadores já haviam encontrado esses sinais entre os dados do CHIME em 2019, mas o novo levantamento trouxe uma perspectiva completamente nova sobre as FRBs. Afinal, são 535 sinais detectados entre 2018 e 2019, sendo que antes havia apenas 100 eventos catalogados. A grande quantidade de eventos não apenas dará aos astrônomos a oportunidade de investigar melhor as rajadas, como também fornecerá uma oportunidade única de estudar todo o universo.

Em primeiro lugar, os dados do CHIME permitirão aos astrônomos encontrar e separar as FRBs que apresentarem diferenças entre si. Além disso, uma amostragem maior ajudará a definir quais são os tipos possíveis de rajadas e em que tipo de lugares elas costumam aparecer. Recentemente um estudo concluiu que a fonte de algumas FRBs são regiões periféricas de braços espirais das galáxias distantes, mas será preciso saber se há outros locais onde elas podem surgir. Os dados do CHIME serão muito úteis nessa tarefa.

Outra utilidade para o novo catálogo de FRBs é o estudo em grande escala de chamado dispersão de ondas. É que conforme as ondas de rádio viajam pelo espaço, eventualmente atravessam algumas nuvens de gás interestelar, ou plasma, antes de chegar a telescópios como o CHIME. Quando isso ocorre, as moléculas desses gases dispersam as propriedades e a trajetória da onda, e o grau dessa dispersão fornecerá pistas sobre os lugares por onde as ondas viajaram.

Durante a apresentação do AAS, Kiyoshi Masui disse que os cientistas podem “medir essa distorção com precisão”, ou seja, “para cada uma dessas explosões, sabemos exatamente por quanta matéria ela passou. Isso carrega um registro da estrutura do universo pela qual viajou para chegar da fonte até nós. Por isso, pensamos que eles serão a ferramenta definitiva para estudar o universo”. Ele completou afirmando que sua equipe quer usar esses dados “para mapear onde todas as coisas estão no universo, qual é a estrutura do universo e como ela é distribuída em escalas muito grandes”.

Masui e sua equipe também mencionaram que a maioria das FRBs se originou de fontes distantes de nós, em galáxias muito afastadas da nossa Via Láctea. Por um lado, essa é uma boa notícia porque essas ondas de rajadas ultrabrilhantes viajaram muito para chegar à Terra, passando por muito gás intergaláctico e plasma, o que certamente será útil para o tipo de pesquisa que Masui pretende fazer. Por outro lado, é uma desvantagem para a compreensão das rajadas em si, que poderiam ser melhor analisadas se chegassem sem muita dispersão, e para isso elas teriam que surgir em galáxias próximas.

Ainda assim, os cientistas estão dispostos a aproveitar a oportunidade para saber mais sobre o universo, usando as FRBs como “sondas cosmológicas”, como disse Alex Josephy, um doutorando em física da Universidade McGill. “Podemos começar a examinar estruturas em grande escala — aglomerados de milhares de galáxias. Podemos ajudar a mapear a distribuição da matéria escura cósmica e estudar a evolução da matéria ao longo da história do nosso universo”.

Essa será uma pesquisa bem vinda, principalmente nos tempos atuais, em que as grandes estruturas recém-descobertas colocam em xeque os modelos cosmológicos usados há cerca de um século. Uma dessas estruturas é o Giant Arc, que mede 3,3 bilhões de anos-luz, desafiando as leis da gravidade de Albert Einstein e o Princípio Cosmológico teórico, que colocam um limite de 1,2 bilhão de anos-luz para qualquer estrutura no universo. Se as FRBs puderem de fato ajudar a medir a distribuição da matéria no cosmos, talvez essa disparidade seja resolvida.

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