Na busca por formas eficazes de tratamento contra o novo coronavírus (SARS-CoV-2), pesquisadores brasileiros descobriram a eficácia de um soro com anticorpos contra a COVID-19, desenvolvido a partir do sangue de cavalos expostos à parte do vírus. A ideia é que esse soro, feito com o plasma dos equinos, seja usado como uma forma de imunização passiva contra a doença.
Segundo o coordenador do projeto, Jerson Lima Silva, do Instituto de Bioquímica Médica da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), os estudos comprovaram que o soro produzido por cavalos para tratamento da COVID-19 é superior ao feito com plasma de doentes convalescentes. Essa é outra técnica, em pesquisa, para combater o coronavírus.
“A gente vê que o nosso anticorpo do cavalo, em alguns casos, é próximo de 100 vezes mais alto. Entre 50 e 100 vezes”, explica Silva. Em outras palavras, os anticorpos produzidos pelos animais neutralizam o vírus com até 100 vezes mais potência, “mesmo quando a gente vai para a preparação final dos soros” do que o soro de pacientes recuperados do doença.
Possível aliado no combate da COVID-19, esse soro é chamado hiperimune ou gamaglobulina hiperimune e, para sua produção, os pesquisadores inocularam (ou seja, introduziram) parte novo coronavírus, durante três semanas, nos plasmas de cinco cavalos do Instituto Vital Brazil (IVB), que é o laboratório oficial do governo fluminense.
Mais especificamente, esses animais foram inoculados com a proteína Spike (que forma os espinhos, em formato de coroa), da membrana do novo coronavírus, responsável por invadir as células humanas. Após 70 dias, os plasmas dos cavalos apresentaram anticorpos neutralizantes 20 a 100 vezes mais potentes contra vírus do que os plasmas de pessoas que tiveram COVID-19 e estão em convalescência, afirma o coordenador do projeto. Com o resultado positivo, a equipe de pesquisadores aguarda o pedido de patente do soro anti-COVID-19.
Segundo o pesquisador, esse resultado da inoculação nos cavalos foi uma grande surpresa. “Os animais nos deram uma resposta impressionante de produção de anticorpos. Inoculamos em cinco e, agora, estamos expandindo para mais cavalos”. Isso porque quatro dos cinco equinos responderam muito rápido ao processo. “O quinto [animal], assim como acontece nos humanos, teve uma resposta mais demorada, mas também respondeu produzindo anticorpos”, comenta Silva.
Uma das vantagens do estudo é que pode ser um tratamento complementar às possibilidades de vacinas contra o vírus, ainda em desenvolvimento. Para isso, a pesquisa ainda precisa completar algumas etapas, como a aprovação da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e da Comissão Nacional de Ética em Pesquisa (Conep) para os testes em humanos.
Em um primeiro momento, o foco será nos pacientes com diagnóstico confirmado para a COVID-19 e que estejam internados, mas não se encontram em unidades de terapia intensiva (UTIs). Dessa forma, será comparado o processo de recuperação daqueles que receberam o tratamento com o soro e os que não receberam.
Para isso, deve haver participação de laboratórios semelhantes que produzem soro no Brasil, localizados em São Paulo e Minas Gerais. Inclusive, os estudos clínicos ocorrerão em parceria com o Instituto D’Or de Pesquisa e Ensino (Idor).
Embora seja uma terapia nova no contexto do coronavírus, a soroterapia é um tratamento bem-sucedido e usado, há décadas, contra doenças como raiva, tétano e picadas de abelhas, cobras e outros animais peçonhentos, como aranhas e escorpiões. Os soros produzidos pelo IVB têm excelente resultado de uso clínico, sem histórico de hipersensibilidade ou quaisquer outras eventuais reações adversas.
Entre os apoios, a pesquisa contou com o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), a Faperj, a Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) e a Financiadora de Estudos e Projetos (Finep).
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