O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Luiz Fux decidiu essa quarta-feira (14) suspender a tramitação do Projeto de Lei da Câmara dos Deputados (PL) 4.850/16, que trata das Dez Medidas de Combate à Corrupção, projeto popular incentivado pelo Ministério Público Federal (MPF).
Na decisão liminar (de caráter provisório) que suspendeu a tramitação do pacote de medidas de combate à corrupção, o ministro argumenta que sua tramitação não obedeceu ao rito previsto para projetos de lei de iniciativa popular. Na decisão, Fux entendeu que houve um erro de tramitação na Câmara e determinou que processo seja devolvido pelo Senado, onde a matéria está em tramitação, para que os deputados possam votar a matéria novamente.
A decisão do ministro anula todas as fases percorridas pelo projeto, inclusive as diversas alterações às medidas propostas inicialmente pelo Ministério Público, como a inclusão dos crimes de responsabilidade para punir juízes e membros do Ministério Público.
O pacote anticorrupção teve origem em uma campanha do Ministério Público e chegou ao Congresso como projeto de iniciativa popular após receber dois milhões de assinaturas. Na madrugada de 30 de novembro, a Câmara aprovou o projeto de lei com diversas alterações, sempre no sentido de amenizar as medidas originais propostas pelo MP. Entre as modificações feitas ao diploma, foi incluída no projeto uma emenda que criminaliza atos de abuso de autoridade cometidos por juízes e membros do Ministério Público.
No dia seguinte, a medida foi criticada pela presidente do STF, ministra Cármen Lúcia, e pelo procurador-geral da República, Rodrigo Janot.
De acordo com despacho do ministro, o projeto deveria seguir uma tramitação especial por tratar-se de uma iniciativa popular, embora reconheça que, desde 1988, nenhum projeto foi autuado formalmente como de iniciativa popular na Câmara. “As comissões não podem discutir e votar projetos de lei de iniciativa popular, que segue o rito previsto no Artigo 252 do referido diploma [Regimento Interno]. Deve a sessão plenária da Câmara ser transformada em Comissão Geral, sob a direção de seu presidente”, disse Fux.
Na decisão, Luiz Fux considerou que as emendas ao projeto contra a corrupção que tratam de crimes de abuso de autoridade de juízes e procuradores do Ministério Público desconfiguraram a proposta popular.
“No que diz respeito à emenda de plenário que trata de crimes de abuso de autoridade de magistrados e membros do Ministério Público, para além de desnaturação da essência da proposta popular destinada ao combate à corrupção, houve preocupante atuação parlamentar contrária e esse desiderato, cujo alcance não prescinde da absoluta independência funcional de julgadores e acusadores”, concluiu Fux.
Câmara enviará ao STF explicações sobre votação
Após ser notificado sobre a decisão, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), considerou a liminar como uma “intromissão indevida do ministro Fux no Legislativo“.
“A princípio a decisão do ministro Fux, questiona a autoria do projeto de lei, nós incluímos matéria estranha ao texto como se nós não pudéssemos emendar a matéria. Isso significa, se é verdade que o ministro Fux tem razão na liminar, significa que a Lei da Ficha Limpa, a partir dos mesmos argumentos do ministro, não tem validade nenhuma, pois também foi uma lei de iniciativa popular e que foi emendada aqui”, disse o presidente.
A Câmara dos Deputados vai encaminhar hoje ao STF as explicações sobre a tramitação e votação do projeto de iniciativa popular que trata das Dez Medidas de Combate à Corrupção. A informação foi dada há pouco pelo presidente da Casa, deputado Rodrigo Maia (DEM-RJ), que determinou à Consultoria Jurídica da Câmara que faça estudos sobre a manifestação do ministro Luiz Fux.
Rodrigo Maia disse acreditar que o episódio será superado com as explicações que a Câmara vai dar ao Supremo. “Vamos superar isso, vamos mostrar ao ministro [Luiz Fux] quais os problemas da liminar concedida por ele, respeitando a soberania que o Parlamento tem de legislar e essa é uma atribuição do Poder Legislativo”, disse.
Mendes critica decisão de Fux e diz que STF vive “surto decisório”
O ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF), classificou hoje (15) a decisão de seu colega Luiz Fux, que ontem ordenou a retomada desde o início da tramitação do pacote anticorrupção aprovado na Câmara, como “tudo que não se faz em matéria de discussão”.
Questionado sobre a decisão de Fux, Mendes respondeu que o STF vive um “surto decisório”, o que não corresponde à tradição do Supremo de ter cautela antes de interferir em conflitos. “Não sei se é a água que estamos bebendo no tribunal”, ironizou. “Estamos em tempos esquisitos”, acrescentou o ministro.
Mendes, que é presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), ressaltou que o processo legislativo tem múltiplos mecanismos de controle, não cabendo interferências judiciais antes que se conclua todo o rito de tramitação dos projetos de lei. “Eu nunca tinha ouvido falar que uma proposta que chega ao Congresso não possa ser modificada. Nesse sentido, o Congresso passa a ser dispensável”, afirmou Gilmar, em referência à decisão liminar proferida por Fux.
Desde o início, o ministro Gilmar Mendes é um crítico contumaz das dez medidas de combate à corrupção, na forma como foram propostas pelo MP. As medidas são defendidas pelos integrantes da força-tarefa da Operação Lava Jato e pelo juiz Sergio Moro.