O observatório espacial INTEGRAL da ESA testemunhou um evento raro: o momento em que os ventos emitidos por uma estrela gigante vermelha expandida reavivaram sua companheira em rotação lenta, o núcleo de uma estrela morta, trazendo-a de volta à vida em um flash de raios-X.
No dia 13 de agosto do ano passado, o INTEGRAL detectou pela primeira vez a emissão de raio-X. A fonte era desconhecida e ia na direção do centro da Via Láctea. A detecção repentina desencadeou uma série de observações nas semanas seguintes a fim de identificar o “culpado”.
As observações seguintes revelaram uma estrela de nêutrons fortemente magnetizada e de rotação lenta que, provavelmente, começou a se alimentar de material proveniente de uma estrela gigante vermelha vizinha.
Estrelas com a massa do nosso Sol, e até oito vezes mais massivas, evoluem para gigantes vermelhas no final de suas vidas. Suas camadas exteriores dilatam e se expandem milhões de quilômetros e suas nuvens poeirentas e gasosas são sopradas para longe da estrela central em ventos lentos de até algumas centenas de quilômetros por segundo.
Já as estrelas maiores, até 25-30 vezes a massa do Sol, esgotam seu combustível e explodem como supernovas, às vezes deixando para trás cadáveres estelares giratórios com um forte campo magnético conhecidos como estrelas de nêutrons.
Estes núcleos minúsculos contêm a massa de quase um Sol e meio em uma esfera com apenas 10 quilômetros de diâmetro, tornando-se alguns dos objetos celestes mais densos que conhecemos.
Não é incomum encontrar estrelas aos pares, mas o novo sistema composto por uma estrela de nêutrons e por uma gigante vermelha é um caso particularmente raro chamado “binário simbiótico de raios-X“, dos quais se conhecem apenas 10.
“O INTEGRAL captou um momento único no nascimento de um raro sistema binário” comenta Enricco Bozzo, da Universidade de Genebra, e autor principal do artigo que descreve a descoberta.
“A gigante vermelha liberou um vento lento e suficientemente denso que veio alimentar sua estrela de nêutrons companheira, dando pela primeira vez origem à emissão altamente energética do núcleo estelar morto”, explica Bozzo.
O par é peculiar. Os telescópios espaciais XMM-Newton da ESA e NuSTAR da NASA mostraram que a estrela de nêutrons completa uma rotação quase a cada duas horas – bastante lenta em comparação com outras estrelas de nêutrons.
Além disso, a primeira medição do campo magnético dessa estrela de nêutrons se revelou surpreendentemente forte – característica que geralmente aponta para uma estrela de nêutrons jovem, pelo fato de se pensar que o campo magnético desaparece com o passar do tempo (uma gigante vermelha é muito mais antiga).
Por esses fatos, o par é considerado bizarro. “Pode ser que o campo magnético da estrela de nêutrons afinal não se desintegre substancialmente com o passar do tempo, ou que a estrela de nêutrons tenha se formado mais tarde na história deste sistema binário”, aponta o autor principal.
Para o cientista, “isto significaria que ela colapsou de uma anã branca para uma estrela de nêutrons como resultado da alimentação da gigante vermelha durante um longo período de tempo, em vez de se tornar uma estrela de nêutrons como resultado de uma explosão de supernova mais tradicional de uma estrela massiva de curta duração”.
Com uma jovem estrela de nêutrons e uma velha gigante vermelha, em algum momento, os ventos que viajam da gigante inchada começarão a cair sobre a estrela menor, diminuindo sua rotação e emitindo raios-X.
Durante os 15 anos de observações com o INTEGRAL, “nunca vimos esse objeto, daí pensarmos que os raios-X foram ativados pela primeira vez“, constata Erik Kuulkers, cientista do projeto INTEGRAL.