Um novo tratamento para o câncer do pâncreas, que pode dar aos pacientes mais tempo de vida e ser uma alternativa à quimioterapia, está sendo desenvolvida por uma equipe internacional.
No trabalho, a equipe demonstrou a possibilidade de utilizar exossomas (nanovesículas produzidas por todas as células humanas) como um veículo para “entregar” no pâncreas uma terapia que inibe a proteína KRAS, “sempre ativada” em pacientes com este tipo de câncer, disse à Lusa a pesquisadora Sónia Melo, do Instituto de Investigação e Inovação em Saúde da Universidade do Porto (i3S), em Portugal.
De acordo com a especialista, cerca de 70% dos pacientes com câncer no pâncreas têm mutação no gene KRAS, que é “muito difícil de desligar”, não por falta de ferramentas para o fazer, mas devido à “localização anatômica” deste órgão, “não sendo fácil encontrar uma terapia que chegue efetivamente ao local”.
Estes exossomas modificados, que carregam a terapia no seu interior, contêm à superfície uma proteína que consegue torná-los “invisíveis” ao sistema imunológico, não sendo assim “destruídos” pelo mesmo.
Sónia Melo indicou que, contrariamente ao que se pensa, o câncer do pâncreas “é tão agressivo como qualquer outro”, diferenciando-se dos restantes apenas por ser “silencioso”, muitas das vezes só existindo sintomas (dores abdominais) quando a lesão já é “bastante grande”, sendo estes pouco específicos.
“Em mais de 80% dos casos, quando os pacientes chegam à clínica, já têm metástases em outros órgãos, como no fígado, na cavidade peritoneal e, muitas vezes, nos pulmões”, disse.
Devido à falta de sintomas, quando descoberto, “a expectativa média de vida dos pacientes é de seis meses”, mas isso acontece “única e exclusivamente” porque o diagnóstico é tardio, enquanto na maior parte dos outros cânceres existem sintomas ou exposições externas que os denuncia e leva a um diagnóstico mais precoce, explicou.
Contudo, quando detectado cedo, “é um tipo de câncer muito fácil de curar”, visto se tratar de um órgão “fácil de remover”, havendo ainda a possibilidade de ser realizada uma laparoscopia (um tipo de cirurgia não invasiva) para retirar a parte afetada do órgão, indicou Sónia Melo.
Embora já existam, hoje em dia, terapias dirigidas para a maior parte dos cânceres, no caso do pâncreas só há tratamentos genéricos, como a quimioterapia, “que matam não são só as [células] cancerígenas, mas todas aquelas que estejam em divisão”, como as do sistema imunológico e as que fazem crescer o cabelo e as unhas.
Para Sónia Melo, desde que surgiram as terapias direcionadas, houve “um decréscimo na mortalidade de quase todos os tipos de câncer”, fato que não se verifica no pâncreas, podendo este estudo trazer “uma nova esperança” para estes casos.
O método de tratamento desenvolvido pela equipe foi testado primeiramente em ratos, estando neste momento sendo utilizado em macacos para, até ao final do ano, passarem aos ensaios clínicos de fase I em pacientes com câncer do pâncreas.
Segundo a cientista, o i3S colabora ainda em um estudo com o Instituto Português de Oncologia do Porto para encontrar, também através da utilização de exossomas, um tratamento mais dirigido para o carcinoma renal, cuja mortalidade também é “muito elevada” e para o qual “não há uma terapia com uma vantagem muita clara para os pacientes”.
// ZAP