A Coreia do Norte anunciou que irá encerrar seu principal centro de testes nucleares, manifestando interesse na “desnuclearização” da península coreana. Mas há dúvidas quanto às boas intenções do regime de Kim Jong-un, e há quem suspeite de que é uma postura forçada pela “síndrome da montanha cansada”.
O anúncio da suspensão dos testes nucleares e de mísseis balísticos intercontinentais e do desmantelamento da base de Punggye-ri, principal instalação de testes nucleares da Coreia do Norte, foi recebido com agrado pela comunidade internacional.
Depois disso, Kim Jong-un, o líder norte-coreano, deu um passo histórico ao se encontrar com o presidente da Coreia do Sul, Moon Jae-in, anunciando a intenção de “desnuclearização da península coreana”.
Mas de boas intenções o inferno está cheio e ninguém está certo sobre qual seria efetivamente o próximo passo do regime norte-coreano. Até porque há suspeitas de que a montanha Mantap, onde se situa a base de Punggye-ri, colapsou, como consequência dos sucessivos testes nucleares no local.
Especialistas acreditam que estamos perante a “síndrome da montanha cansada”, depois de ter acolhido cinco dos últimos seis testes nucleares realizados pelo regime norte-coreano.
“Explosões nucleares repetidas podem enfraquecer a rocha em torno de locais de testes nucleares subterrâneos, acabando, eventualmente, por torná-los inseguros ou inutilizáveis”, explica o Live Science.
“17 vezes mais” poderoso do que a bomba de Hiroshima
O último teste nuclear realizado nos túneis da base de Punggye-ri, em setembro de 2017, foi “17 vezes mais” poderoso que a bomba lançada sobre Hiroshima em 1945, causando um tremor de terra de 6.3 de magnitude na Escala Richter, nota o Washington Post.
Essa megaexplosão pode ter rasgado um buraco na montanha, levando-a a entrar em colapso, segundo uma pesquisa do geólogo da Universidade de Ciência e Tecnologia da China, Wen Lianxing, citada pelo South China Morning Post.
A “bomba de 100 quilômetros” deflagrada em 3 de setembro do ano passado “vaporizou as rochas circundantes com um calor sem precedentes, abrindo um espaço de cerca de 200 metros de diâmetro”, refere uma nota da equipe de Wen Lianxing.
Outra pesquisa realizada por Liu Junqing, da Agência de Sismos chinesa, revela as mesmas conclusões e alerta que o colapso “não só fez deslizar parte do cume da montanha, mas também criou uma chaminé” que poderia permitir a passagem de “precipitação radioativa” para o ar.
O acadêmico chinês Hu Xingdou refere na mesma publicação que os testes nucleares em Punggye-ri também poderiam estar “aumentando o risco de erupção na Montanha Changbai”, um vulcão ativo na fronteira entre a Coreia e a China.
Perante esses riscos, a China, o grande aliado da Coreia do Norte, pode ter alertado os vizinhos para a necessidade de encerrar o centro de testes nucleares – até porque a China tem se manifestado publicamente contra os ensaios nucleares de Pyongyang.
O “síndrome da montanha cansada”
“Quando uma explosão nuclear dispara dentro de uma montanha, parte as rochas circundantes e a energia se propaga como uma onda (imagine atirar uma pedra para um lago)”, esclarece o Live Science. “À medida que mais explosões deflagram em torno do mesmo – mas não do exato – ponto, as rochas que estão mais distantes também começam a desmoronar sob o repetido estresse”, acrescenta a publicação.
A “síndrome da montanha cansada” é “o efeito acumulado dessas explosões, que enfraquece as rochas e cria essas fraturas mais distantes do ponto de explosão”, explica o sismólogo do Laboratório Nacional de Los Alamos, nos EUA, Dale Anderson.
Anderson acrescenta que essas fraturas abertas também podem ser um caminho para a liberação de gás radioativo para a atmosfera. Um risco que continuará latente e que exige monitoração permanente, segundo os especialistas.
Todavia, a hipótese da “síndrome da montanha cansada” não é unânime e há geólogos defendendo que ainda “há muita montanha” para suportar mais testes nucleares.
Como exemplo apontam o caso da antiga União Soviética e da Montanha Degelen, situada no atual Cazaquistão, que aguentou mais de 200 explosões nucleares antes de atingir o ponto do colapso.
Certo é que, se confirmado esse colapso na base de Punggye-ri, é um grande golpe no programa nuclear norte-coreano, e poderia ter sido determinante para a surpreendente postura pacífica de Kim Jong-un. Mas, por outro lado, também pode ser uma oportunidade para o regime norte-coreano definir um novo local para testes nucleares, longe dos olhares internacionais.
A Associated Press revela que a Coreia do Norte vai convidar peritos dos EUA e da Coreia do Sul para verificarem in loco o fechamento da base de Punggye-ri. Falta saber quando isso acontecerá, enquanto se espera também o agendamento definitivo do histórico encontro entre Kim Jong-un e Donald Trump.
Ciberia // ZAP