Cientistas da Faculdade de Wililam e Mary, nos EUA estudam um animal muito curioso: o verme Auanema rhodensis que, além de possuir três sexos, desafia a genética de outras maneiras, ainda mais ousadas.
Ter três sexos – masculino, feminino e hermafrodita – não é assim tão incomum no reino animal. Em certos organismos, é até normal. O que é mais raro, no entanto, são hermafroditas autoférteis. Por exemplo, as minhocas são animais hermafroditas, mas ainda assim são necessárias duas para fazer minhocas bebês.
Outros organismos apresentam hermafroditismo sequencial, por exemplo, ostras e outros mariscos mudam de sexo à medida que envelhecem ou quando há a necessidade na colônia.
Auanema rhodensis é uma espécie de nematoide que muda tudo o que sabemos (ou pensamos saber) sobre o assunto. A espécie é verdadeiramente trissexual. Embora estes hermafroditas sejam autoférteis, são também sexualmente versáteis, aptos e dispostos a cruzar com machos e fêmeas da espécie.
Isso por si só já é raro, mas se somarmos isso a uma quebra das regras de reprodução sexual e assexuada conhecidas, o caso fica ainda mais curioso.
Na maioria dos animais, a reprodução depende de cromossomos sexuais: X e Y. Por exemplo, as fêmeas humanas são XX e os machos são XY. Os machos produzem uma mistura de 50% de esperma X e Y, e o esperma vencedor determina o sexo da criança.
Diane Shakes, do departamento de biologia da Faculdade de Wililam e Mary, explica que, de acordo com a genética mendeliana, a população humana em geral não possui exatamente 50% de cada sexo, mas fica por aí.
Em A. rhodensis, no entanto, as fêmeas e os hermafroditas são XX, enquanto os machos têm um único X e nenhum Y. Ou seja, esta espécie não só tem três sexos, como seus padrões de herança genética confundem todas as previsões.
“O que descobrimos é que A. rhodensis desenvolveu maneiras de se afastar do livro de regras da genética – especificamente no que diz respeito ao modo como lida com o cromossomo X”, explica Shakes.
Em estudos anteriores, Shakes e seus colegas descobriram que as células produtoras de esperma em machos de A. rhodensis “sequestram” um programa celular normalmente usado para facilitar o movimento do esperma a fim de usá-lo para produzir exclusivamente espermatozoides X. Assim, quando cruzam com as fêmeas, geram apenas descendência feminina.
Os indivíduos hermafroditas dessa espécie não ficam atrás, já que manipulam os dados genéticos. Enquanto o padrão dita que hermafroditas XX devem produzir óvulos e esperma com apenas um X, os cientistas descobriram que A. rhodensis contorna essas regras produzindo esperma com dois cromossomos X e óvulos sem nenhum cromossomo.
Logo, quando hermafroditas produzem descendentes sozinhas, autofertilizando-se, produzem na maior parte fêmeas XX e hermafroditas XX. Se cruzam com um macho, a junção de esperma masculino com apenas um X com óvulos sem nenhum X produz descendência masculina.
Com todas as peculiaridades, o estudo do A. rhodensis pode ser útil para a saúde humana, especialmente a análise da segregação de cromossomos.
A segregação de cromossomos pode ser ruim em seres humanos. Anormalidades nessa etapa levam, na maioria dos casos, a abortos espontâneos. A mais famosa ocorrência na qual um embrião sobrevive a esse defeito é a síndrome de Down, onde há uma cópia extra de um cromossomo pequeno.
Além de erros no desenvolvimento embrionário, Shakes observa que erros de segregação cromossômica aparecem também no desenvolvimento de muitos tipos de câncer.
As nematoides são ótimas cobaias para o estudo da genética humana. Um modelo muito utilizado é o C. elegans, um verme com aproximadamente o mesmo número de genes e funcionalmente idênticos a nós.
Mas o A. rhodensis, tem três sexos, que oferecem táticas reprodutivas adicionais.
As vantagens adaptativas de ser um hermafrodita autofértil são óbvias. Um hermafrodita A. rhodensis sozinho em uma ilha deserta não ficará sozinho por muito tempo. Mas há um preço a pagar por essa vantagem e a falta de diversidade genética que beneficia a distância é o maior.
Shakes diz que sua hipótese sobre a estratégia reprodutiva do A. rhodensis pode ser resumida como uma aposta com a evolução. “Eu penso na espécie como uma jogadora, sempre a fazer apostas se a vida vai ficar boa ou má. Essas apostas assumem a forma de uma mistura de sexos descendentes. O objetivo final é fazer tantos filhos quanto possível”, argumenta.
Quando a vida é boa e há alimento suficiente, uma mistura masculina e feminina vai surgir. Já se o ambiente em que a colônia vive mudando muito rapidamente e se tornar ruim, esses animais vão preferir criar muitos hermafroditas que vão se espalhar pelo mundo para explorar novos canais de alimento e começar novas colônias.
Por enquanto, essas são apenas hipóteses, porque sabemos muito pouco sobre o que esses animais fazem na natureza. O A. rhodensis só foi encontrado duas vezes no seu habitat natural, nos estados americanos de Connecticut e Virgínia.
Ambos os espécimes foram descobertos associados a outros animais, um carrapato e um besouro. Shakes afirma que os vermes exploradores provavelmente estavam interessados em transporte.
“Provavelmente não estavam infectando esses besouros ou carrapatos, apenas procurando uma carona. Eles querem se movimentar. Possuem apenas um milímetro de comprimento, não podem rastejar muito longe”, explicou.
Ciberia // HypeScience / ZAP